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Obra de 2018 é influenciada por “Garota Exemplar” de Gillian Flynn e, assim como o romance norte-americano, a trama de Rodrigues surpreende gradativamente.

É com muito prazer que abro os trabalhos nessa coluna com “O Monstro Atrás da Porta”, um romance de mistério escrito pelo pernambucano Landerson Rodrigues e lançado em 2018 pela Editora PenDragon, que também funciona como prestadora de serviços.

Como eu disse no texto introdutório desta seção, eu acredito que discussões acerca das obras aqui analisadas podem realmente fomentar, de forma geral, a literatura. É por esse motivo que deixo, desde já, o link para compra do livro: https://www.lojapendragon.com.br/policial/livro-o-monstro-atras-da-porta

Apesar de eu evitar spoilers a todo custo, fica a seu critério a leitura da obra antes de discutir comigo, aqui neste post, a trama de Rodrigues.

Dado os lembretes, vamos à narrativa de fato:

A trama de “O Monstro Atrás da Porta” é intercalada sob o ponto de vista em primeira pessoa de dois detetives: Rodrigo Montibeller e Alexandre Belarmino. Enquanto Rodrigo tem anos de experiência e um histórico de destaques no cargo, Alexandre está apenas começando na profissão, de modo que Rodrigo é apresentado com idolatria pelo parceiro.

Logo no início da narrativa, descobrimos que os detetives foram enviados para investigar um assassinato ocorrido de forma bastante similar a outro há exatamente um ano. Além de local, perfil de vítima e modo de assassinato, o caso também traz outra semelhança com o anterior: o(a) assassino(a) deixa um bilhete destinado a Rodrigo. É dada então a largada para a solução não apenas desses dois casos, mas também das mensagens indecifráveis destinadas a um dos maiores detetives do país.

Como podemos ver, a premissa é instigante, e o capítulo 1 mantém essa cortina de mistério.

Já o capítulo seguinte continua dinâmico, com Alexandre sendo perseguido por um carro, o que me fez anotar a minha primeira crítica. A placa do veículo é POYA 12345, uma placa convenientemente fácil para ser decorada. Para mim, isso acabou quebrando o clima de suspense. Fica óbvio que uma placa tão fácil como essa não deve ser de uma pessoa comum, que não se esconde, e que não troca de placa rotineiramente. Como eu acredito que tudo que está sendo narrado deve ter algum significado, fiquei me perguntando o quão interessante seria uma sequência de número que poderia trazer algum significado maior para a trama. A estória está envolta de homicídios. Seria muito interessante, por exemplo, que a placa envolvesse o art. 121. Assim, além de não ficar óbvio que a placa não está no nome de ninguém, também eleva os simbolismos presentes na narrativa.

Essa ausência de simbolismo também continuou com outra sequência de números. A casa de Jeane Lins, uma testemunha, tem o número 3245 e saber disso não me acrescentou muita coisa, uma vez que, para mim, não teve nenhum significado para além daquilo dali.

Quanto à linguagem em si, apesar da narrativa fluir muito bem, algumas vezes a pontuação, ao meu ponto de vista, não é muito precisa, o que acabou chamando a minha atenção negativamente. Ademais, a falta de consistência com o tempo verbal, como em um dos trechos da página 24, também se destacou negativamente na minha leitura.

A trama, ainda que intercalada pelas vozes em primeira pessoa dos protagonistas, não utilizou muito o famoso recurso literário “show, don’t tell”, que basicamente tem como princípio descrever (por meio de características e sensações dos cinco sentidos) em vez de simplesmente contar os eventos. Para mim, a predominância do tell não afetou muito a sensação de visualizar ou sentir que um livro pode proporcionar.

Tratando-se de um romance policial, o ponto mais alto da trama, na minha opinião, é a balança muito eficaz entre o mistério dos casos e os próprios dramas dos protagonistas, uma característica que a cada vez mais vem se tornando tendência nesse tipo de estória, o que, para mim, é um alívio.

Embora o autor saiba equilibrar muito bem as estórias paralelas à trama principal, há dois personagens que, na minha concepção, precisam ser melhor lapidados. Alexandre Belarmino, embora apresente motivação é extremamente chato e seu conhecimento em singles como “I’m a slave 4 you”, “Slumber Party” e “Breathe on Me” da cantora norte-americana Britney Spears me faz questionar a sua personalidade. Um policial e hetero da última geração não me parece o tipo de pessoa que iria a um show da Princesinha do Pop. No entanto, Alexandre sabe alguns versos e compara como ninguém os clipes da cantora com suas situações atuais. Ficou difícil acreditar em sua personalidade depois de demonstrado tamanha sabedoria no universo pop. Além disso, as referências a series norte-americanas como Scandal e Cold Case me pareceram mais fanservice do que referências a obras policiais de mistério. Da forma como foram postas, as séries supracitadas me pareceram um tanto soltas.

A segunda personagem com problemas é Stacey. Primeiramente, como não conheço muito a cultura Portuguesa, não vou falar do nome da personagem, apesar de eu ter me perguntado diversas vezes se uma personagem portuguesa teria um nome tão americanizado, no meu ponto de vista. Alexandre nos conta que ela tem um sotaque lindo português. No entanto, ao ler suas falas, nunca diria que ela é de Portugal. Nesse caso, sim, em minha opinião, faltou nos proporcionar a identidade de Stacey e compartilhar a paixão que Alexandre sentia por ela, para que nós pudéssemos sentir também.

Mas, felizmente, Rodrigo é um personagem bem complexo e repleto de camadas. Eu sempre ficava feliz em ler seus capítulos e os dramas de sua vida eram a razão para isso. A masturbação, o fantasma e a mensagem recebida em seu celular (ainda que eu tenha minhas críticas ao último tópico) realmente foram algumas cenas em que eu realmente sentia emoção, empatia e adrenalina. Acredito que a grande responsável por isso tenha sido a junção entre estrutura, palavras e personagens que o autor escolheu tecer para compor capítulos tão autênticos.

Também achei interessante o quão distintas as festas de fim de ano se dão para os dois protagonistas.

O livro também transpira críticas sociais que eu desconfio veemente se tratarem da opinião do autor. Seguindo esses capítulos de festas de fim ano, por exemplo, Rodrigo discorre sobre machismo e “a garota legal” e o quão patético tudo isso é. Essa crítica, assim como todas as outras, me incomodou fortemente, pois, a forte influência dos temas que “Garota Exemplar” traz não casou com a trama. A impressão que eu tive é que a crítica ficou solta num enredo paralelo, pois não tinha lugar na estória. Creio que a crítica ao machismo é mais potente e coesa na cena de Amigo X, onde o narrador, embora “neutro”, tenha nos mostrado que as mulheres ganharam utensílios domésticos e os homens objetos de negócio, como carteira e gravatas.

Assim como a crítica social anterior, há um capítulo em que Alexandre detona o carnaval e o conecta à corrupção e várias outras coisas negativas que acontecem no nosso país.

E, finalmente, chegando ao final das minhas impressões, preciso falar da cena do estupro que, apesar de nojenta e eficaz, traz comparações extremamente fracas – o que quebra o clima de empatia que o capítulo até então conseguia tecer.

Eu quase finalizei o post me esquecendo de elogiar o trabalho visual que esse livro tem. A capa é extremamente linda, assim como a diagramação. Não por acaso os designers envolvidos são os mesmos que trabalham na minha coletânea, hahaha.

Dito tudo isto, recomendo o livro para todos que gostam de romance policial e consequentemente de mistério, além de uma trama recheada de reviravoltas. Quem me conhece sabe que este não é nem de longe o meu gênero literário favorito, mas eu gostei da obra, e estou super curioso para ler os futuros trabalhos do autor. Acho que ele tem muito futuro no meio literário.

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